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quarta-feira, 17 de junho de 2009

Novo Ciclo


Após alguns meses de abandono, volto lentamente pensar e alimentar esse pequeno filhote, esse diário aberto de uma vida, que por estar inserido no jogo coletivo, sofre com o apagamento das características individuais deste sujeito que escreve...

Um lugar para o corpo


“Eu não sou intelectual, eu escrevo com o corpo”. Clarice Lispector
por Poliana Bicalho

O corpo está no centro das relações humanas. A partir desta afirmativa, pretendo neste texto abordar sobre o corpo, a partir das contribuições dos teóricos Jean-Jacques Courtine, Marcel Mauss e Michel Foucault. Acredito que essa abordagem, elucidará novos olhares sobre este que é o principal instrumento de trabalho do ator: o corpo.
Na história mundial até o final do século XIX, tudo contribuiria para o corpo possuir um papel secundário. No entanto, na virada do século a relação começou a ser definida com o apagamento da linha divisória entre corpo e espirito, e o corpo humano deixa de ser 'um envelope da alma'. O século XX inventou teoricamente o corpo; no campo da psicanálise Freud – 'o inconsciente fala através do corpo' . Para o autor Courtine (2008 p.07-08) este primeiro passo foi decisivo, dado que abriu a questão das somatizações, e fez que se levasse em conta a imagem do corpo na formação do sujeito, daquilo que viria a ser o 'eu-pele'. Neste aspecto, o autor cita ainda os teórico Edmund Husserl que influenciaria Maurice Merleau-Ponty na compreensão do corpo como 'encarnação da consciência'. No campo da antropologia Marcel Mauss (1914-1918), a partir de um trabalho de observação da infantaria britânica e francesa teoriza sobre a questão da 'técnica corporal'. Para Mauss (1974, p. 211), é por intermédio das necessidades e das atividades corporais que a estrutura social imprime sua marca sobre os indivíduos. Ainda a respeito das técnicas corporais, o autor diz que entende por essa palavra as maneiras como os homens, sociedade por sociedade e de maneira tradicional, sabem servir-se de seus corpos. Desta maneira, o corpo passa estar ligado a questões de subjetividade e de relações de poder, inserindo-se nas formas sociais da cultura, não sendo apenas um 'pedaço de carne'.
A partir da década de 60 o corpo desempenha os primeiros papéis nos movimentos individualistas e igualitaristas, os movimentos de minorias de raça, de classe, de origem e de gênero que utilizam como slogan a frase: 'Nosso corpo nos pertence!'. É através da legitimidade deste corpo, que estes sujeitos lutam contra todas as forças que os oprimem, e é a partir do momento que o sujeito passa a ter o conhecimento que seu corpo sofre uma serie de regras e condutas que o aprisionam, em leis e morais que o adestram, ele passa a poder lutar contra todas estas forças, pois antes do corpo pertencer as instituições, ela pertence aos sujeitos.
Milanez (2006) afirma que “o corpo é um arquipélago”, uma vez que se compõem não de uma única unidade, mas traz memórias, por vezes até mesmo inumeráveis, dos poderes que o sustentam e o constituem como objeto físico-discursivo. É esse mosaico de saberes, memórias e encontro com outros corpos que a nossa identidade é constituída, e no meio de tantas metamorfoses corporais (plásticas, tatuagens, piercing, transplantes) será que Meu corpo será sempre o meu corpo? (COURTINE, 2008, p.12) para o autor ainda a um longo caminho da história do corpo.
Todo este percurso teórico é para que possamos pensar NESTE corpo com a arte, perpassado por memórias, e é nesta perspectiva que Rodolf Laban aborda a questão da corporeidade e do 'saber-sentir' do ator/bailarino (compreensão por vezes desprezada ou desconhecida pelos estudiosos e praticantes dos fundamentos do autor).
Este texto não pretende ser um jogo de perguntas e respostas, mas apenas de colocações e muitas dúvidas, pois ainda a um longo caminho teórico para se trilhar na busca de compreensões sobre o corpo, este ponto de partida e chegada do sujeito.